Em tempo de quarentena, uma mensagem de idoso para idoso

Geração Xmais Por Geração Xmais

Vânia Portela, durante evento realizado em 2019, promovido pela Geração Xmais, mostrou como a dança ensina a levar a vida com leveza (Foto: Jerônimo Poggi/Geração Xmais)

Geral, publicado em 24/03/2020

Por Vânia Portela, 74 anos
Psicóloga clínica e organizacional
Especialista em psicoterapia da família

Nunca, nos meus tantos anos de vida, eu tinha vivido algo assim e, com certeza, você também não. Nem mesmo na guerra ficamos sujeitos a tantas restrições e impedidos do poder de tomar nossas próprias decisões.

Estou aqui trancafiada no meu quarto, recebendo comida feita com todo amor pela minha neta, numa mesinha que fica do lado de fora do quarto. Uma “cela”, sim, com conforto, mas “cela”! Cadê meu direito de ir e vir que está na Constituição?!

A gente se revolta, não acredita no que está acontecendo. Os anos de experiência nesta hora nos cegam, e a gente acha tudo um exagero. Nós aprendemos com a vida, sabemos o que deve ser feito, o que é melhor para a gente. Por que ninguém acredita nisso?! Insistem em nos direcionar?!

Também passei por isso… Depois da raiva, vem a depressão, a solidão, o medo, a impotência diante da situação. A gente baixa a cabeça, engole o orgulho, deixa-se guiar, sentindo-se velho, perdendo o respeito dos outros, sem opinião, sem poder de mando na nossa própria vida…

É aí onde mora o perigo!

É neste momento, meu colega idoso, que temos que saber quem somos para fazermos uso da verdadeira sabedoria que acumulamos ao longo dos anos. Se você não pode fazer isso, é porque passou pela vida e não se tornou sábio, ainda.

Não foram poucas as vezes que tivemos que nos adaptar, que tivemos que ouvir quem sabia mais do que nós. Não foram poucas as ocasiões que precisamos jogar fora o que sabíamos e aprender o novo, para nos sentirmos integrados ao momento e às pessoas.

Não foram poucas também as situações em que ajudamos os outros a atravessarem suas crises, consolando, dando ideias, fazendo valer nossa experiência. Foi assim que transformamos conhecimento em sabedoria.

Chegou a nossa hora, queridos, de assumir nosso papel neste momento da história e colocar em prática toda esta experiência que acumulamos.

Temos direito aos nossos momentos de depressão, de medo, de solidão, de pedir ajuda, de sermos frágeis, porém, não temos o direito de ficarmos debruçados sobre estes momentos, indefinidamente.

Não vamos ser estorvos para nossos filhos que só querem o nosso bem. Vamos ser solução!

Vamos usar nosso conhecimento para ensinar pequenas coisas que ajudam no dia a dia.

Os jovens estão sem saber o que fazer para cuidar de uma casa com praticidade. Nós sabemos, vivemos isso e podemos dar dicas e orientá-los nesta difícil jornada, com amor e compreensão.

Os pais viveram tanto tempo fora de casa que não sabem como distrair os filhos neste momento.

Nós já fomos pais, vivemos isso também. É chegada a hora dos avós, via internet, trazer momentos de lazer com eles, contar histórias e até mesmo só conversar, ouvir suas dúvidas e suas angústias. Os pequeninos também possuem angústias e estão sem saber o que está havendo. Os pais já estão com tarefas demais para ter a paciência que só os avós possuem.

Nossos filhos precisam de nós. Do nosso colo para ouvir suas dificuldades neste momento que estão passando. Não precisam ter que lidar com nossas birras e teimosias, colocando entraves no processo que não nos cabe gerir porque é de um tamanho tão imenso, que só Deus na causa!

Vamos formar um time de idosos, saudáveis, conscientes de que ainda temos um papel neste mundo de Deus, enquanto vida tivermos, prontos para colaborar, para ouvir, para se adaptar e ajudar uns aos outros. Dispostos a aprender, usando nossa experiência para nos ajudar a viver este momento e para ajudar os outros a crescerem com este momento.

Vamos trocar, entre nós, o que estamos fazendo para passar o tempo e para ajudar os nossos.

Estou aqui à disposição de vocês, caso queiram trocar ideias e saber como estou podendo ser feliz nesta minha “celinha privilegiada”, cercada de amor e carinho dos meus e contribuindo para que eles também atravessem esta fase.

Vamos deixar de remoer pensamentos, não vamos endossar a ideia de que todo velho é teimoso!

Vamos trocar a teimosia pela sabedoria e mostrar o nosso valor neste momento de pavor!

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