Idoso, velhice, terceira idade ou meia-idade? Vale a reflexão


Aqueles que lidam com a arte da escrita bem sabem que a língua é cheia de figuras poéticas que dão asas à imaginação. Não é que essas chamadas alegorias (ou expressões figurativas) também se transformam em moda dentro do universo linguístico do envelhecimento?
É só prestar atenção para perceber que instantaneamente são usados termos ora criativos, ora inusitados para se referir às pessoas idosas. Para começo de conversa, muita gente opta por não falar mais em velhos; acharam-se novas formas de descrever a velhice.
‘Terceira idade’, ‘boa idade’ e ‘melhor idade’ são apenas algumas expressões frequentemente aplicadas a assuntos ligados aos idosos. Pare para refletir e veja como é importante ter muito tato para aplicar esses termos… Por que ‘terceira idade’? Alguém pode explicar que a denominação é usada pelo fato de se pressupor que a infância e a fase adulta seriam, respectivamente, a primeira e a segunda idades. Sim, mas é só uma hipótese; nada que seja concreto ou oficial.
E mais: segundo o escritor Celso Japiassu, na apresentação do livro Maturidade (Ed. Campus), da jornalista Léa Reis, o aparecimento da expressão ‘terceira idade’ só deu margem a ações de marketing que consideram o surgimento de um novo mercado para os produtos do mundo capitalista pós-industrial.
No livro, diz também o jornalista paulista Marcelo Coelho, que a ‘famosa terceira idade’ fundamenta-se em uma contagem abstrata do tempo; é paradoxal. “Pois quem é velho vive da contagem concreta dos anos, dos feitos, dos casos, dos números”, escreve Coelho. E o que leva a aplicação dos adjetivos ‘boa’ e ‘melhor’ para nomear a velhice? As outras fases da vida, então, seriam sem graça e monótonas? Ainda tem a tal da ‘meia-idade’… “Acho que não dá mais para rotular. E o que seria a idade-cheia?”, questiona Léa Reis.
Claro que já me senti seduzida a aplicar esses termos em um texto, em uma conversa ou em uma palestra. Confesso que foi justamente a insistência em usar essas expressões que me levaram a observar que existe um medo, entre as pessoas, de utilizar todos os prefixos e sufixos que se ligam ao radical ‘velh’.
É preciso se quebrar preconceitos e perceber que o envelhecimento não é uma diminuição da produtividade, da inteligência, do bom humor e da capacidade física. É preciso quebrar o paradigma que o uso do radical ‘velh’ pode ser uma atitude de mau-gosto ou de falta de respeito. Não é bem assim. Acredite: as pessoas que envelhecem bem psicologicamente até preferem que ‘terceira idade’ e ‘boa idade’ passem bem longe das denominações aplicadas a elas. É que elas sabem bem que envelhecer não é um caminho à decrepitude, mas uma afirmação do princípio de autorrenovação.
O entrave é que, erroneamente, ainda existe a ideia de que toques de senilidade implicam queda de produção. Só que velhice tem pouco a ver com fragilidade e muito a ver com amadurecimento. Trata-se de um exercício para nos convencer de que parecer mais velho é muito mais atraente do que ser imaturo.
Uma prova? Quantas vezes é possível se maravilhar com o caráter, a inteligência e a história dos mais velhos? Várias, não é? Use, então, essa resposta como incentivo para mostrar as pessoas que utilizar ‘terceira idade’, ‘boa idade’ e ‘melhor idade’ não se trata de uma questão de excelência, mas de descaracterização do que realmente a velhice é.
Mas veja bem: não alie velhos ao sentido de que não são ativos. Afinal, é muito especial perceber a existência de um grupo de pessoas inteligentes, generosas, engraçadas, misteriosas, cheias de graça, que – pelo Brasil – somam 30 milhões de pessoas com mais de 60 anos. São eles, claro, os idosos.